Comunicação
How to Be a Human Being
Como se comunicar
Quem nunca viu alguém se gabar sobre quão bom comunicador era, ou viu alguém em algum momento falar sobre como se sobressaiu em determinado assunto somente se expressando? Você já teve a impressão de falar, falar e não ser ouvido?
Eu nunca tinha entendido, verdadeiramente, o quanto me comunicar era essencial. Não que eu não seja um bom comunicador - longe disso -, eu só achava que não era necessário melhorar ou me aperfeiçoar nisso. Achava que pelo meu ponto de observação - afinal, sempre fui alguém muito reservado e propenso a entender o mundo bem melhor calado e reflexivo - eu poderia pegar as coisas no ar e falar quando fosse necessário e se eu me sentisse à vontade. E a vida fluiu bem até então. Até que… não fluía mais. Um dia eu acordei e tinha ao meu lado uma filha, um relacionamento sério, uma equipe de trabalho, uma família cheia de irmãs, primos, tios, avós e então chegar o momento em que eu falava com tantas pessoas e minha energia era drenada, eu me esforçava para elaborar ideias e eram recusadas, eu tentava dizer o que eu sentia e somente saíam sons e pensei: “eu estou sendo ouvido”?
Então, caiu a ficha de que talvez ao longo desse tempo outras pessoas sentiam exatamente o mesmo comigo e mais uma vez outro pensamento tomou minha cabeça: eu sequer sei me comunicar bem?
Por que, então, escrever sobre isso? Porque pela comunicação efetiva algumas pessoas já conseguiram impedir grandes conflitos, enquanto que outras vezes a má comunicação foi responsável por catástrofes mundiais. E, tendo percebido o quanto esta era uma habilidade que eu ainda necessitava melhorar, me surpreendi com o quanto eu desconhecia sobre algo tão inerente à humanidade.
Comunicação: não é sobre você
“The effectiveness of communication is not defined by the communication, but by the response.” –Milton Erickson.
Até um monólogo autobiográfico não é sobre o autor. Somos apenas um ponto de interesse momentâneo em outra história que se abre voluntariamente para ouvir a nossa. É isto.
Poupei anos de terapia para você. Aliás, pode fechar o departamento de RH também, a partir de hoje é só escutar os problemas dos funcionários.
Grandes comunicadores sabem disso, mesmo que involuntariamente. Ninguém sobe num palanque, do vereador local da sua cidade a Donald Trump, e diz que vai resolver os próprios problemas. Não, ele vai resolver os SEUS problemas, porque ele precisa que VOCÊ entenda o quanto ELE é importante para VOCÊ. Não é sobre Donald Trump ter levado um tiro na orelha, mas sobre ele ter levado um tiro pelos Estados Unidos da América.
Entretanto, todas as narrativas são pessoais. O vereador da sua cidade não vai dizer em formato de diário da cidade tudo que ocorreu de melhor por conta do governo atual, ou da economia ou por ter recebido verbas astronômicas. Não, as coisas melhoraram porque ele, com toda sua motivação e força de vontade, se dedicou com toda a sua potência para mudar o mundo para melhor. Assim somos todos nós.
Porém, existe espaço para o herói e para o coadjuvante em nossas histórias, assim como existe espaço para outras pessoas. É a partir daí que criamos sintonia, comparação, equiparação, simpatia, empatia e afins. Uma comunicação que não gera nada passa no vazio e deixa espaço vago para qualquer entendimento mínimo. É importante sempre considerar o seguinte: o valor da comunicação não está no emissor, mas no receptor.
Isso, de certa maneira, passa despercebido durante interações diárias, mas à medida que vamos entendendo o contexto, vai ficando mais claro. No início da carreira, eu desenvolvi uma facilidade óbvia em entrevistas. Mentalmente eu sabia que, se fosse chamado para uma entrevista (o que era definitivamente bastante complicado em início de carreira), eu já teria o suficiente para conseguir a vaga. E não digo isso de um ponto de autoconfiança ou egocentrismo, mas de interesse. Eu me interessava, genuinamente, pelo que estava aplicando. Quando era chamado para alguma entrevista de vaga que por sorte ainda estava aberta, eu mantinha meu interesse não em mim, mas no que aquilo poderia trazer de especial. E os recrutadores, avaliadores e staff sentiam o mesmo. Talvez não fosse o melhor tecnicamente, mas eu tinha o interesse da minha narrativa e o reflexo da narrativa do entrevistador. Queria saber os pormenores do projeto, o objetivo final, quem estava envolvido, as motivações, e isso se refletia em entender, de verdade, o que o outro me dizia. Junto à minha história, eu conseguia encaixar pontos onde eu poderia ser útil e acrescentar em algo positivamente.
Flashforward para tempos recentes: eu estava fazendo o mesmo com as pessoas do meu dia a dia? De colegas de trabalho à minha companheira, estas pessoas se sentiam ouvidas ou eu queria apenas ser ouvido, entendido e validado?
Como Ouvir Melhor
Seria tudo muito simples apenas escutar e ficar mudo, mas não… todos querem que você entenda. E, sendo franco, queremos o mesmo também, certo? E que tal se mudarmos o foco de nós mesmos para outro alguém, para aprender algo novo com isso? Talvez o ponto de início para comunicar melhor seja ouvir mais?
Sempre me falaram que nascemos com duas orelhas e uma boca para ouvir mais e falar menos. Tendo sido sempre reservado, achei que tinha entendido bem. Engano meu, pois não ouvi direito.
Na maior parte das vezes, nosso comportamento dita a maneira como as pessoas ao redor vão se comportar também. O que não queremos próximo, repelimos; o que nos agrada, acolhemos.
E se eu queria comunicar melhor minhas necessidades e minhas direções, talvez eu precisasse entender como fazer isso na outra ponta, onde eu entendia a partir de mim o que é necessário para ser entendido.
Foi assim, então, que me deparei com possibilidades de compreender melhor e entender bem o que outra pessoa dizia. Algo que me ajudou muito melhor em minha escuta foi empregar as técnicas de escuta ativa. Boa parte parecia tão bobo para ser considerado até entender como empregar isto na minha vivência. Pergunte, engaje em uma comunicação de duas vias, tenha interesse genuíno pelo que outra pessoa fala. Faça perguntas como: “o que você pensa sobre isso?” ou “e o que você sente com isso”. Valide as respostas, veja como aquilo se reflete em você. Essas são chaves para manter o interesse do locutor: encontrar um ponto de reflexão do outro em si.
E como fazer isso de maneira mais prática? Crie links. Ouça pontos-chave das histórias que você escuta, se atente às peças principais, evolua o diálogo com o que já existe inicialmente. Criar links mostra que você estava, ao menos, se esforçando para entender algo da história e vai ajudar bastante a memorizar coisas do dia a dia. Sério.
Alguns anos atrás esta foi a melhor dica que eu recebi. Crie um mapa do que foi dito e apresentado, entenda qual o objeto central e dele crie conexões que ajudem a desenvolver a sua própria ideia. E foi assim que eu consegui uma nota excelente (cof cof, exibido) no meu primeiro teste de proficiência do TOEFL. Reunir informação sobre todo o contexto e tudo que foi dito é extremamente cansativo, ainda mais se você tiver uma perninha faltando no cromossomo Y, for viciado em vídeos curtos e/ou tiver TDAH. Fazer links rápidos poupa bastante energia que se você, assim como eu, tem falta para situações sociais desde nascença, sabe que é importante economizar.
Como Falar Melhor
Ok. Agora que eu posso escutar melhor, entendo também o que posso utilizar de melhor na minha comunicação. E como todo comediante sabe, o que importa para entregar o conteúdo é: timing.
Pare de desperdiçar tempo. O seu, o do outro, o do mundo. A vida acontece rápido e acaba num piscar de olhos, é importante aproveitar as chances de colocar as coisas no lugar e tirar o melhor delas. Nem passivo, nem agressivo, seja direto e gentil, assertivamente.
“A assertividade é definida como a habilidade de expressar emoções ou opiniões de maneira firme diante de outras pessoas, sem mostrar hostilidade ou agressão. As pessoas assertivas sabem declarar suas opiniões e sentimentos, tanto positivos como negativos, de maneira direta e transparente.” - Algum site aí
Esta é uma habilidade que precisa ser lapidada diariamente. Dizer o que quer, quando quer, com clareza. Dar brechas para falso entendimento ou desvirtuar suas palavras pode ser algo bastante delicado em situações que dependem quase exclusivamente do que você gostaria de dizer.
Dito isso, nem sempre você vai estar no melhor dia ou no melhor momento para falar algo e ter feedback sobre isso é muito importante. Treine conversar, contar histórias, ter uma sequência narrativa na sua cabeça com começo, meio e fim. Ninguém quer saber o que você sentiu na manhã primaveril de 24 de Julho de 2003 ao abrir a porta do carro se isso não tiver algo a ver com o que vier em seguida. As pessoas estão sempre em busca de uma boa história, algo que as inspire em qualquer coisa quando o mundo ao redor é tão caótico e simulado. É preciso tirar disso uma oportunidade para si e para as pessoas ao redor.
“Como o que eu tenho a dizer pode, de maneira sucinta, levar esta pessoa a me entender?”.
E foi justamente o que eu pensei, naquela manhã quente de 2024, em que eu acordava bastante sonolento do trabalho no dia anterior, levantava para ir ao outro quarto e olhava diretamente para a figura de menos de um metro esparramada na cama à frente abraçada a um pinguim de pelúcia. Chamei várias vezes a pequena que chorava incontrolavelmente para não ir à escola. Perguntei a ela o que tinha e ela respondeu que estava com bastante sono. Disse que poderíamos dormir mais cedo hoje, mas que era necessário ir à escola assim mesmo, porque haveria muitas coisas legais. Minha filha rebateu que queria ficar em casa assim mesmo dormindo e eu sugeri que ela levasse o Pingu (o pinguim de pelúcia) para a escola, porque ele ia querer conhecer as outras crianças. “Por que?”, perguntou. Fui ouvido. Contei sobre como pinguins andam por aí querendo conhecer o mundo e que se eles passam tempo demais na cama ficam chateados o dia todo. Não precisei de mais que isso para convencer a pequena sobre o mundo dos pinguins que vão à escola, só precisava ser escutado.
Uma Nota Sobre o Estoicismo
Melhorar a comunicação é uma jornada, não um destino.
O Estoicismo se tornou uma corrente filosófica da qual tiro boa parte da minha própria visão de melhoria e dos valores que foram se tornando parte do meu dia a dia.
O estoicismo, que não deixa de ser uma filosofia bem antiga - datando de 300 anos antes de Cristo -, pode parecer um pouco séria à primeira vista, mas carrega conselhos práticos e valores para o nosso dia a dia que são bastante valiosos. Os estóicos acreditavam em viver uma vida de virtude, que inclui sabedoria, coragem, justiça e temperança e percebi que essas virtudes podem mudar totalmente o modo como nos comunicamos.
Foi por meio desta corrente que comecei a compreender que é impossível garantir o pensamento de outro alguém sobre o que comunico, mas posso reagir positivamente aos diálogos que tenho, tendo coragem de emitir minha opinião com franqueza, honestidade, paciência e temperança. Nem sempre as coisas sairão imediatamente como gostaria, mas o aprendizado vem por meio de erros também. O controle sobre minhas ações na direção da comunicação mostram onde quero chegar com clareza no diálogo e ajudam a quem recebe minha visão de mundo com maior afinidade e empatia. Talvez seja este o objetivo final, certo?
E desta maneira, por meio de práticas, como não tomar tudo como verdade, evitar fazer suposições, julgar menos ações externas, se atrelar aos seus valores, boa parte do objetivo de se comunicar melhor pode ser atingido e estimulada.
“Everything we hear is an opinion, not a fact. Everything we see is a perspective, not the truth.”
― Marcus Aurelius , Meditations
Conclusão
Estar, ainda, aprendendo a me comunicar tem sido um processo de descobertas, por meio do qual a minha vivência e socialização têm melhorado continuamente. Por ter sido sempre um ponto que me tirava energia, sempre recuei da necessidade de melhorar-me neste âmbito até perceber o quanto poderia ganhar com isso e me tornar, inclusive, uma pessoa melhor. E perceber todo o potencial que o mero ato de comunicar pode trazer, tem feito com que eu olhe as coisas com outros olhos, de curiosidade e interesse.
Agradecimentos especiais à Beatriz nesse processo que começou muito por ela e que continua com bastante carinho mútuo :)
Referências: